Bolsonaro quer destruir papel social do Estado e serviço público

Nesta quinta-feira (03), o governo de Jair Bolsonaro enviou ao Congresso mais uma pauta explosiva que visa destruir não só os direitos e aumentar a fragilidade das relações de trabalho no setor público, mas principalmente derreter o papel do Estado brasileiro de garantir serviços públicos de qualidade. Trata-se de um pacote de Leis Complementares e Projetos de Emendas à Constituição apelidado de “Reforma Administrativa”.

Para a diretora Cleide Ferreira, a proposta ataca a estabilidade do servidor público, que fica sujeito aos interesses imediatos dos governantes. “Se isso for aprovado, em breve, os prefeitos estarão livres para contratar ou demitir servidores de acordo com interesses alheios à qualidade dos serviços públicos”.

Sob os carcomidos argumentos neoliberais de que seria necessário “racionalizar e modernizar” o serviço público porque o Estado brasileiro é “inchado”, “ineficiente por natureza” e os servidores “parasitas” – alegações que não possuem qualquer base na realidade, o presidente e seu ministro Paulo Guedes, representantes de um governo inimigo dos trabalhadores do setor público, têm o objetivo de realizar reformas profundas no setor público que mexem com as carreiras de trabalhadores fundamentais para execução dos serviços públicos na pandemia.

Já na primeira fase da “Reforma Administrativa”, Bolsonaro quer aumentar os poderes presidenciais para reorganizar os cargos públicos, inclusive a natureza dos cargos cargos públicos. Ou seja, aumenta excessivamente os poderes do chefe do executivo deixando o setor público ainda mais vulnerável aos humores político-partidários de ocasião.

Entre outros pontos estão a instituição de novos vínculos de trabalho no setor: experiência, prazo determinado e prazo indeterminado; proibição de período de férias superior a 30 dias por ano; proíbe a redução de jornada sem diminuição de remuneração; proíbe, também, promoções ou progressões feitas exclusivamente por tempo de serviço; maior rigor nas avaliações de desempenho e redução do número de carreiras típicas de estado

De acordo com o Fórum das Carreiras Típicas do Estado (Fonacate), tais carreiras seriam aquelas que correspondem “aos interesses fundamentais, precípuos do estado e, em razão disso, exigem dos ocupantes não apenas um conhecimento diferenciado, mas igualmente a disponibilidade de arcar com elevadas responsabilidades, o que os diferenciam dos demais servidores públicos”. Desta forma, classificam como típicas do estado, as carreiras da área de fiscalização tributária e de relação de trabalho, arrecadação, finanças e controle, gestão pública, comércio exterior, áreas da segurança pública, diplomacia, advocacia pública, defensoria pública, regulação, política monetária e inteligência de estado, além de planejamento e orçamento federal, magistratura e ministério público. 

Dependente ainda de análise pelo Congresso Nacional, a PEC mira os futuros servidores nos Três Poderes na União, Estados e Municípios. “Embora os autores e apoiadores dessas medidas justifiquem a proposta pelo combate aos “privilégios” dos “parasitas”, a Reforma poupa, justamente, os setores que ocupam os altos cargos públicos e usufruem desses privilégios: procuradores, promotores, deputados e senadores”, ironiza a auxiliar de enfermagem Rita Bulhões.

Outra medida é o aumento da seleção para entrada no serviço público. Atualmente, a pessoa aprovada em concurso passa por 03 anos de estágio probatório que, em geral, não prejudica nomeação efetiva. No entanto, se a nova regra for aprovada, o concursado terá que enfrentar 2 anos de experiência – com um vínculo frágil – e mais um ano de estágio probatório. Após esse período de três anos, o governo selecionará aqueles que forem aprovados de acordo com as vagas disponíveis e a classificação conquistada após o período de experiência. A questão que fica é: a aprovação em concurso público já não é suficiente comprovação do mérito?

Caso aprovadas, essas regras vão gerar ameaças graves à estabilidade no serviço público.

Falsa modernização

Em seu site, o diretor do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central , Iso Sendacz, criticou a apresentação da Reforma Administrativa feita pelo Secretário de Desburocratização Gleisson Rubin, auxiliar de Paulo Guedes. “Reclamando de uma folha de pagamentos funcional que não passa da quarta parte da despesa financeira do governo, chegou ao extremo de reclamar da aposentadoria do servidor público, em grave ameaça aos seus pares da iniciativa privada”.

Ele desmistifica ainda a suposta intenção modernizadora do pacote. Mas ressalta que “a solidez do concurso público como forma de ingresso”, desde os tempos de Getúlio Vargas, e “a proteção da estabilidade ante a pressões por interesses adversos ao público por determinados governantes ou oportunistas infiltrados são reconhecidas como necessárias no projeto”. No entanto, as propostas concretas já mencionadas neste texto apontam, justamente, no sentido contrário a esse reconhecimento.

“As mentes privatistas escolheram mostrar o crescimento do custo de pessoal em um período em que houve recuperação das perdas passadas, omitindo que a dívida pública cresceu 213% no período, mais de cinco vezes que a folha de salários”, destaca. “Por isso, é desprezível a ilusão de o crescimento do investimento público dever-se ao desmonte do Estado proposto, com a consequente redução dos serviços públicos”.

Os últimos apagam a luz

O diretor Marcelo Arias alerta que, a continuar nesse rumo, os servidores atualmente em atividade serão os últimos a integrarem um setor público ainda com relativa preocupação e condições em oferecer serviços públicos para a população, especialmente em setores essenciais à população como saúde, educação e assistência social. “O processo destruição prossegue. Já houve a Reforma Trabalhista, da Previdência, outras minirreformas, e agora está sendo apresentado esse pesadelo . Precisamos encontrar formas de resistir a isso e construir condições de manter nossos direitos”.

Com informações da Folha de S.Paulo

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